Aquele homem
J. J. Duran
Lembro-me das tuas mãos esticadas à procura de minhas mãos ainda pequenas e que, depois de uma louca correria, iam em busca de teu refúgio seguro e paternal.
Lembro-me das tuas mãos acariciando os cabelos louros de meu irmão, como o bom lavrador contempla o fruto do seu esforço nos campos dourados de trigo.
Lembro-me de vê-lo sereno, porém firme, mostrando a todos nós da tua família o caminho pelo qual deveríamos transitar unidos, seguindo teus passos seguros e sem descompasso.
Lembro-me de tuas mãos de homem inteligente e culto escrevendo em cada lauda a passagem de um tempo que ia tingindo inexoravelmente de cinza os teus cabelos negros.
Lembro-me de suas mãos apertando-me contra teu peito naquela época em que outros homens me empurraram para o longo caminho do exílio.
Lembro-me de tuas mãos apertando entre os dedos suplicantes teu rosário, que levei por muitos anos como símbolo de sua relação com o Bom Judeu.
Lembro-me de teus temores, de teu sorriso, de teus conselhos que comecei a compreender mais tarde, em meus muitos momentos de solidão.
Lembro-me de tua ternura e da pureza de teu olhar quando fazia a leitura dos problemas e das diferenças entre eu e meu irmão.
Lembro-me de tantas coisas de você que quando meus filhos da esperança gritam "pai" o fantasma do tempo me leva de pronto ao nosso antigo lar platino.
Os arcos misteriosos de minha vida se renovam em cada filho de outros pais que me dão a sensação de ter a força e a dignidade que você teve, mesmo na pobreza.
Solitário, naveguei até chegar cansado e desiludido a este calmo ribeirão chamado Cascavel, que escolhi para ser minha morada definitiva.
Espero reencontrá-lo nesse verde prado chamado Céu, que tantas vezes descreveste de forma magistral.
Deus está ao teu lado. Reza para que eu também volte a estar contigo. (Foto:Motortion/iStock)
J. J. Duran é jornalista, membro da Academia Cascavelense de Letras e Cidadão Honorário de Cascavel e do Paraná